Lustrosa e o seu lindo casaco

Conheço uma ervilha. Chama-se Lustrosa. Lustrosa é muito limpinha. Quando era pequena andava sempre com uma manta. Levava-a para todo o lado. Era verde. A manta. Lustrosa tem um casaco. É muito leve. O casaco. Nem todas as ervilhas acham o seu casaco bonito, mas Lustrosa esforça-se por que o casaco que usa seja, a cada momento, considerado bonito pelo maior número de ervilhas possível. Por isso, muda frequentemente de casaco e faz estudos de opinião. Não só porque a moda é efémera, mas também para experimentar novos conceitos de estética.

As outras ervilhas não se apercebem das mudanças pensadas de casaco. Se se apercebessem iriam pensar que Lustrosa era demasiado preocupada com a opinião das outras ervilhas. Não poderia haver outra razão para dar tanta importância à cor e ao feitio do seu casaco. Porém, Lustrosa nunca se preocupou com a opinião das outras ervilhas. Não no sentido habitual, de ser insegura e precisar da aprovação do mundo. Lustrosa sabia que a opinião das outras ervilhas sobre o seu casaco era crucial para conseguir o que queria noutros campos da vida. Era essa a sua motivação.

Lustrosa guiava-se pelo moto: "Dá água a uma ervilha e matarás a sua sede; ensina-a a drenar canais e perderás o teu ganha-pão." Era por isso que Lustrosa não partilhava as suas Teorias do Casaco com ninguém. Preferia esperar que lhe pedissem ajuda com algum problema específico e apresentar a sua solução sem nunca explicar as suas escolhas. Algumas ervilhas achavam que ela era uma egoísta. Outras percebiam que o segredo era a alma do negócio. Outras ainda, não tinham opinião formada no assunto. Eram as mesmas que se abstinham em todas as eleições legislativas. Exactamente as mesmas que Lustrosa, quando ao serviço de Rogilas, tanto se esforçava por convencer a desenhar uma letra X num pedaço de papel. Elas, burras de todo, nem isso conseguiam fazer. Era por isso que Lustrosa tanto se esforçava por lhes ensinar o alfabeto. Felizmente elas nunca o aprendiam. Só assim Lustrosa era novamente contratada por Rogilas. Ano após ano. Ano após ano.

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